sábado, 3 de maio de 2014

O barco no mar de Verão

Embarcam um barco sem fado veraneantes aventureiros leves de culpa e cheios de vontades diversas, tantas que se contradizem umas às outras, mas o que importa se o barco não tem fado?
Os veraneantes perseguem apenas o Verão, ou não fossem apenas veraniantes que vivem apenas pelo Verão, rumo às águas quentes do Verão onde quer que este esteja.
O destino não existe, apenas o agora desde que seja rumo ao Verão. As ondas do mar guiam o seu rumo, o seu destino é ditado pelo vento e os seus remos acariciam as ondas do mar para que neste não se sinta agredido pelo bater dos remos.
O barco é longo, espaçoso e nada de mal lhe pode tocar. Os quartos são quentes e cheiram a madeira fresca, os seus cortinados cheiram a panos limpo e a água salgada. Os cheiros misturam-se com as fragâncias de flores frescas acabadas de colher.
O Sol brilha e aquece os aposentos que se enchem de luz e calor vindo de toda a atmosfera.
O mar está calmo e os ocupantes lançam ancoras para disrutar dos prazeres aquáticos nas águas cálidas do mar do Verão.
É o festim de todas as coisas que pairam no ar de Verão, no ar de quem se deixa iluminar pelas luzes vindas de longe, pelas luzes e luzinhas e reflexos brilhantes que ondulam deliciados nas ondas do mar.
Os corpos relaxam, cada músculo se deixa embalar pelas ondas calmas e ondulantes, os cabelos soltos dançam livres com o passar de cada onda que os acaricia tão docemente que o arrepio desperta embevecido pela candura e delicadeza do deslizar da água salgada.
Os corpos mergulham sem contenção até onde as suas capacidades alcançam, são livres e da liberdade vivem. Dentro do mar vivem livres , mesmo que os seus pulmões respirem oxigénio, é no mar que se sentem livres, se sentem em casa, não importa onde o mar os leve, porque o que é que importa, desde que seja Verão?
O mar do Verão trás-lhes tanta plenitude que nada que existe em terra faz sentido, mesmo que em terra exista mais alimento, os corpos buscam outra paz, a paz que não se busca em coisas térreas.
Bem sabiam os veraneantes que no mar do Verão é que estão bem.
Partem veraneantes em busca do seu Verão, sem destino e sem fim porque estão no apenas agora e agora respiram o caminho do Verão.
Do mar regressam os veraneantes e aos seus aposentos regressam, com os corpos leves de tudo a carregados de muito mais que apenas eles mesmos, carregados de tanto que parece tão pouco aos olhos de quem coisa alguma disto entende.
O Sol desaparece ao longe por detrás das ondas calmas do mar de Verão e os veraneantes emudecidos adormecem alimentados pela paz que carregam.
No Verão também acontecem as mais violentas tempestades, mesmo que seja Verão.
O barco segue as ondas que o conduzem a onde desejam que o barco esteja e aos poucos o vento começa a soprar com mais força e algumas nuvens aparecem no céu. O barco continua no seu rumo e o vento sopra com mais força. Os remadores recolhem os remos e aumentam as precauções. Gotas de água fortes começam a cair sobre o barco enquanto os veraneantes dormem calma e serenamente. As gotas de água são cada vez mais e maiores, o céu enche-se de nuvens carregadas de chuva e rebenta o primeiro desabar do céu. Cai com mais violência a chuva que se envolve no vento e tomam o espaço todo por sua conta. A chuva e o vento varrem todo o mar com a sua fúria, enquanto o barco luta para se manter em equilíbrio. O mastro do barco acolhe as velas que enroladas se deixam estar. A chuva e o vento sacodem o barco em todas as direções, mas os tripulantes não sentem nada. O barco assume o controlo do seu equilibrio, mesmo que se debata com a violência dos predadores do céu.
A noite de tempestade prolonga-se até de madrugada, onde os primeiros raios de Sol ganham força e destemidamente , como de espadas se tratassem, irrompem por entre as núvens quase esgotadas da diversão, mesmo que ainda meio rebeldes.
O Sol volta a aquecer o ar e as ondas mar de Verão. Os veraneantes por nada deram, nem mesmo nos momentos de maior batalha . . . por nada deram porque este barco foi construído para ser indestrutível, para assumir o comando no momento da tempestade, para que os tripulantes sigam o seu rumo no mar de Verão, porque é do mar que se alimentam, porque em terra apenas é uma passagem breve.
Embarcados no barco do mar de Verão seguem os tripulantes desprovidos de medo, porque mesmo sem destino, estão no barco do mar de Verão.

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